Num dia desses, almoçando e conversando com o Carca ele me contou uma estória mais ou menos assim:
"Era uma vez um designer gráfico que, cansado da vida miserável que vivia, entre os bares e o trabalho, enchendo a cara de layouts e criando porres regados a pizza barata, resolveu mudar e decidiu que, para isso, iria colocar sob sua responsabilidade alguma coisa importante, valorosa, que desse sentido à sua vivência. Começou pensando num animalzinho, um cachorro, um gato, um hamster, uma tartaruga, um pexinho...
- Não, é melhor eu ir aos poucos com essa coisa de responsbilidades. Preciso de alguma coisa que aguente pelo menos uma semana sem que precise de mim, pensou ele comedidamente.
Tendo sempre em mente suas limitações mas determinado a encarar de frente sua nova fase, estava ele no supermercado providenciando seu suprimento semanal de suprimentos etílicos quando, como que por um estalo, ele o encontrou. Lá estava ele, cheio de vida, o mais belo manjericão que já avistara em seus 30 anos!
Foi amor à primeira vista... O pobre designer se encantou de tal maneira que não pensou duas vezes, largou as cervejas e foi direto ao caixa, para levar logo para casa seu novo companheiro.
Estava enibriado. Chegava a sonhar com ele. Depois daquele dia seus layouts todos tinham nuances esverdeadas e ninguém conseguia entender muito bem o motivo, mas sim, era tudo por conta de seu mais novo amor.
De repente, sem entender bem o porquê, o manjericão parecia já não se mostrar tão verde. Dia após dia foi se amarelando, perdendo o viço e a cor e levando junto consigo os poucos cabelos que ainda restavam naquela desconsolada cabeça. Foi um processo irreversível, uma doença termial cruel que, em poucos dias levara toda a vida que enchera seu pequeno apartamento.
Mas o designer resistiu bravamente, era orgulhoso demais para demonstrar seu sofrimento e sua dor. Seus dias tornaram-se cinzentos e tudo de verde que havia por perto lhe provocava uma nostalgia dolorosa. Guardou com carinho a última coisa que lhe restava do companheiro de incursões gastronômicas, o pequeno vazinho preto que, agora vazio, outrora servira de morada para sua grande paixão.
Qual não foi sua surpresa na noite em que, chegando de mais daquelas bebedeiras que constantemente promovia para tentar esquecer-se do manjericão, encontrou algo diferente no vaso. Era um pequeno ponto verde, brotando lá do fundo da terra negra! Ele voltou! Encontrou forças e voltou para mim! pensou o pobre designer.
Com a vista turva pelo álcool, achou que o manjericão estava com a forma um pouco diferente, mas não pode conter sua felicidade ao sentir que não dormiria sozinho novamente e abriu uma garrafa de vinho para comemorar com seu recém-retornado companheiro.
Como era de costume nessas ocasiões de alta embriaguez, dormiu no sofá, com aquele sorriso de canto de boca, próprio dos enamorados. Acordou atrasado, como não poderia deixar de ser, tomou um banho rápido e, antes de sair para o trabalho foi se despedir do manjericão quando, atônito, descobriu que não era seu companheiro que lá estava mas um estranho, intrometido e pedante trevo que indelicadamente ocupara o lugar do manjericão. Aquilo era demais, teve o ímpeto de jogar tudo pela janela, sentiu-se traído e enganado por aquela plantinha inferior que decidira, sem consultá-lo ir morar em seu apartamento e, o que era pior, tentando ocupar o lugar de seu pobre manjericão que mal acabara de virar adubo.
Levando as mão à cabeça, não sabia o que fazer e por fim, depois de passar uns bons 30 segundos pensando resolveu ir trabalhar e deixar essa estória toda de amadurecer, tomar responsabilidades e criar plantas para lá, isso tudo era demais para ele.
Passaram-se alguns dias sem que sequer se lembrasse de olhar para o vaso quando, ao chegar em casa estranhou que havia um vaso novo na sua janela. Chegando mais perto percebeu que não era um novo vaso, mas o mesmo, só que cheio de pequenos trevos, que tomavam quase todo o espaço a pouco tempo ocupado apenas de terra... E o que era melhor, ele sequer precisara cuidar e dar atenção aos trevinhos, eles por conta própria estava se aranjando, crescendo e se multiplicando sem a menor cerimônia, lá dentro de seu apartamento..."
Qual será a moral da estória?
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